Seminário exibiu o documentário Monocultura da Energia e discutiu problemas e soluções para transicionar a matriz energética de forma a contemplar os direitos humanos, territoriais e ambientais
Foto: Ilustrativa
Mas quem está pensando no impacto que os empreendimentos de energia podem ter nas comunidades tradicionais? E mais: elas estão sendo ouvidas?
Este foi o tema do seminário que ocorreu nesta quarta-feira, 10/04, na Câmara dos Deputados, realizado pelo GT Clima, que é coordenado pelo gabinete da deputada Taliria Petrone (PSOL-RJ), e GT Energias Renováveis, coordenado pelo gabinete do deputado Pedro Campos (PSB-PE), ambos grupos Frente Parlamentar Ambientalista, e apoiado pelas entidades Fundação Heinrich Boll, 350.org, International Center for Journalists (ICFJ) e ((o))eco.
Ao abrir o evento, a deputada Taliria Petrone, destacou a importância do debate no contexto dos desafios democráticos que a Frente Ambientalista enfrenta. "É mais uma agenda muito importante do nosso grupo de trabalho e da nossa Frente Ambientalista, que tem sido um instrumento de resistência nesses últimos anos de derretimento da nossa democracia, o que tem o impacto nas comunidades tradicionais e na natureza. E também um espaço de propor uma agenda do Bem Viver na reconstrução do Brasil", disse.
Após a abertura, foi exibida a websérie documental Monocultura da Energia, disponível na plataforma ((o))eco e dirigida por Bárbara Poerner e Rodrigo Ferreira, que narra quatro histórias, do Brasil à Argentina: a disputa para explorar petróleo na Foz do Amazonas, uma das áreas mais socioambientalmente sensíveis do planeta; o impacto do fracking (método de extração não convencional de gás) argentino e os riscos caso a técnica chegue ao nordeste brasileiro; os ecossistemas e as populações afetadas pelos parques eólicos no Rio Grande do Norte; e, por fim, um episódio final com reflexões sobre o que é energia justa e limpa pela voz de pessoas indígenas, quilombolas, ribeirinhas e pescadoras.
Participaram do debate Maria Araújo, representante do Coletivo Cirandas, que atua em defesa de comunidades tradicionais no Rio Grande do Norte; Vinícius Oliveira, representante da Rede Energia e Comunidades; Paulo Cardoso, representante do coletivo Utopia Negra Amapaense, que aborda questões de transição e pobreza energética no Amapá sob uma perspectiva racializada; Janina Karipuna, presidenta da Associação dos Povos Indígenas em Mutirão (AMIM), de Oiapoque (AP); Lucas Pereira, representante do Movimento Atingidos por Barragens (MAB) de Minas Gerais e pesquisador popular do Projeto Veredas Sol e Lares, uma experiência de transição energética popular no Vale do Jequitinhonha; e Bárbara Poerner, diretora da websérie Monocultura da Energia.
O objetivo foi ouvir sobre como as comunidades brasileiras devem ser consideradas nas agendas de transição energética, aproximando os tomadores de decisão e a sociedade civil de cada um dos temas abordados, e usar o documentário como uma ferramenta de defesa dos direitos humanos, ambientais e territoriais.
Janina Karipuka, que também é cacica da aldeia Espírito Santo, contou quais as implicações que já estão ocorrendo em Oiapoque com o interesse da Petrobras em explorar óleo e gás na região. "Temos batido na tecla para que nós, lideranças, sejamos consultados sobre esse empreendimento, pois ele irá nos afetar direta ou indiretamente, principalmente em relação às nossas terras indígenas. Mesmo com a fase de pesquisa, já sofremos com os impactos sociais".
Debates sobre energia limpa
O Rio Grande do Norte é o estado que mais produz energia eólica no Brasil. São mais de 260 parques, espalhados em 41 municípios, conforme o Mapa das Energias Renováveis. Além disso, existem 257 empreendimentos de energia fotovoltaica e outros 234 em construção. No panorama brasileiro, a eólica representa 13% de toda a geração elétrica. A região nordeste equivale a mais de 93% dessa capacidade.
Contudo, os impactos da energia eólica envolvem fatores sociais, culturais, econômicos e ambientais, que vão desde a degradação de ecossistemas da Caatinga até cerceamento de locais que antes eram comunitários. Em 2022, o bioma teve 4 mil hectares destruídos para a produção de energia gerada pelo sol e vento.
Maria Araújo explicou que recentemente o Coletivo Cirandas realizou em seis comunidades do litoral potiguar, em parcerias com outras entidades, uma cartografia social do mar. Trata-se de um documento na qual "os moradores, sejam eles, pescadores, pescadores, marisqueiros e marisqueiras das comunidades, delimitam suas áreas de uso. Vimos que a disputa dos territórios para implementação das eólicas offshore (no mar) se sobrepõe aos espaços críticos que os pescadores utilizam, e as empresas também se sobrepõem umas às outras".
Embora nosso país tenha sua matriz elétrica majoritariamente renovável, a maioria desses projetos energéticos não consideram as populações locais em seus processos de implementação e operação. "A agenda da transição energética deve contemplar, invariavelmente, a escuta ativa das comunidades atingidas pelos empreendimentos, incluindo suas demandas, considerando seus modos de vida e respeitando seus direitos territoriais", defendeu Bárbara Poerner.
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