Após nove anos de debates, audiências e ajustes, o Código Ambiental do Rio Grande do Sul, que havia sido moldado com a contribuição de especialistas renomados como José Lutzenberger, sofreu uma transformação radical em 2019. A gestão do governador Eduardo Leite (PSDB) liderou uma iniciativa que resultou na eliminação ou alteração de 480 pontos da legislação ambiental estadual, em um processo marcado pela celeridade e pela controvérsia.
FOTO: LAURO ALVES/SECOM
O projeto de Leite, apresentado em setembro de 2019 e aprovado pela base governista na Assembleia Legislativa em apenas 75 dias, foi duramente criticado por grupos ambientalistas e pela oposição. Entre as principais mudanças estão: a flexibilização das exigências e a concessão de auto licenciamento em determinados casos, em uma evidente tentativa de favorecer os interesses empresariais.
Ambientalistas e técnicos apontaram diversas falhas e retrocessos no novo código, que, segundo eles, desmantelou décadas de avanços na proteção ambiental no estado. Francisco Milanez, presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), descreveu o projeto como “desestruturante, destruidor e prostituinte”, ressaltando que representava um retrocesso de 40 anos na legislação ambiental gaúcha, como citado pelo Brasil de Fato.
Entre as críticas levantadas pelos especialistas, destacam-se a redução das medidas de proteção em áreas sensíveis, o afrouxamento do licenciamento ambiental, a terceirização da fiscalização e a desregulamentação do corte de árvores e da exploração de recursos naturais. O novo código também foi acusado de enfraquecer a proteção das florestas, das nascentes e das áreas de preservação permanente.
O governo estadual defendeu o projeto como uma “modernização necessária para equilibrar a proteção ambiental e o desenvolvimento econômico”, argumentando que as mudanças proporcionariam maior segurança jurídica e incentivo à participação da sociedade
As recentes crises climáticas no estado, como as enchentes que assolam o Vale do Taquari e a região metropolitana de Porto Alegre, trouxeram à tona o debate sobre a relação entre as políticas ambientais e os desastres naturais. Entidades como a Agapan alertaram para a urgência de ações concretas para enfrentar a crise climática, incluindo a recomposição das áreas de preservação e o desassoreamento dos rios.
Diante desse cenário, a aprovação de novas medidas que flexibilizam ainda mais as regulamentações ambientais, como a expansão da silvicultura e a construção de barragens em áreas de preservação permanente, previstos no plano de Leite, tem gerado preocupação e indignação entre os defensores do meio ambiente.
No dia 14 de setembro de 2023, em meio aos desafios enfrentados pelas comunidades do Vale do Taquari após uma devastadora enchente, o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema) do Rio Grande do Sul atualizou a Lei do Zoneamento Ambiental para a Atividade da Silvicultura (ZAS).
As áreas designadas para a silvicultura aumentarão de 900 mil ou 1 milhão de hectares para 4 milhões de hectares em cada Unidade de Paisagem Natural (UPN) x Bacia Hidrográfica (BH). A silvicultura, prática de cultivo de florestas para o fornecimento de madeira e uso racional das florestas, tem no Rio Grande do Sul, particularmente, o eucalipto como uma de suas principais culturas.
A secretária estadual do Meio Ambiente, nomeada por Leite, Marjorie Kauffmann, celebrou a aprovação, apesar dos alertas emitidos por técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) sobre os riscos de perda de biodiversidade. O Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá), também membro do Consema, emitiu um parecer contrário à mudança, destacando o potencial impacto negativo na região do Pampa e dos Campos Sulinos. Além disso, o InGá argumentou que a proposta aprovada foi elaborada por empresas contratadas pelo setor a ser regulado, levantando questionamentos sobre a imparcialidade do processo.
Por Mídia Ninja
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