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Foto do escritorSolano Ferreira

Comunidade protegida por lei, praia do Perequê é ameaçada por lixo deixado por banhistas

Foto: Ítalo Braga Castro


Agência FAPESP* –André Julião | Agência FAPESP – Estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) encontrou altos níveis de contaminação na praia do Perequê, no Guarujá (SP), com prevalência de plásticos e bitucas de cigarro. O detalhado levantamento, um dos poucos do tipo feitos no mundo, abre caminho para a implementação de políticas públicas para mitigar o problema.


Os resultados foram publicados no Marine Pollution Bulletin.


O projeto foi uma parceria do Instituto do Mar (IMar) da Unifesp, em Santos, com a Secretaria do Meio Ambiente do Guarujá. O objetivo era compreender as fontes de contaminação da praia, que faz parte de uma Área de Proteção Ambiental (APA Marinha Litoral Centro), tem uma das maiores e mais tradicionais comunidades de pescadores da Baixada Santista e uma intensa atividade turística.


Os pesquisadores estabeleceram dez pontos na faixa de areia, com 100 metros quadrados cada, onde coletaram todo o lixo contido no inverno e no verão, ao longo da semana e nos sábados e domingos.


“Os resultados dão conta de que o lixo na praia é prioritariamente resultado de atividades turísticas. No verão é mais grave, o que indica que, embora os moradores possam ser responsáveis por algum resíduo, os maiores responsáveis são os banhistas”, aponta Ítalo Braga de Castro, professor do IMar-Unifesp e coordenador do estudo.


Os níveis de contaminação por plástico e por bitucas de cigarro foram considerados altos, de acordo com um índice internacional usado pelos pesquisadores. Entre 12 estudos realizados no mundo usando o mesmo método, os níveis de contaminação da praia do Perequê foram os mais altos.


“As bitucas de cigarro são o resíduo que mais tem aparecido em praias, tanto neste estudo quanto em outros realizados em diferentes partes do mundo. O que é alarmante, uma vez que elas carregam muitos componentes tóxicos, mais de 7 mil em alguns casos, pelo menos 150 prejudiciais para humanos e para a biota. São conhecidos como ‘bombas químicas’”, resume Victor Vasques Ribeiro, primeiro autor do estudo, apoiado pela FAPESP com bolsa de doutorado no IMar-Unifesp.


De plástico a concreto


Para chegar aos resultados, o grupo delimitou dez pontos na praia do Perequê, cinco na parte molhada e cinco na parte seca. Em cada um deles, foi delimitada uma área de 100 metros quadrados, onde todos os detritos com mais de 3 centímetros eram recolhidos e armazenados. Cerca de 20 voluntários realizaram as coletas com os cientistas, no inverno e no verão, em 2022 e 2023, em fins de semana e dias úteis.


Os itens foram posteriormente classificados como plástico, metal, vidro, papel/papelão, roupa/têxtil e madeira processada (usada em móveis e construções). Devido à alta incidência e potencial impacto, as bitucas foram classificadas numa categoria à parte. O que não se encaixava em nenhuma classificação foi reunido como “outros”.


Foram 2.579 itens coletados numa área de 4 mil metros quadrados, o que caracteriza a praia do Perequê como “suja”, de acordo com os padrões do Clean-Coast Index. O método, publicado em 2007, tem sido usado em estudos do tipo desde esse ano.


Equipe que realizou as coletas na praia do Perequê, no Guarujá (foto: Italo Braga Castro)


Os níveis de lixo aumentaram durante o verão, em comparação ao inverno, quando foram considerados “moderados”. O resultado era esperado, dado o maior número de turistas durante o alto verão. Os níveis são similares aos encontrados em outras praias da América Latina, incluindo do Brasil.


Nas duas estações, os níveis de lixo eram mais altos na parte seca da praia, comparada à parte que recebe o impacto das ondas. A disparidade também era previsível, uma vez que o vento normalmente leva os detritos mais leves para a parte seca. Além disso, as pessoas fazem mais uso desse local, onde fazem consumo de alimentos e cigarros, descartando embalagens e bitucas.


Por outro lado, itens pesados, como cacos de cerâmica e concreto, foram mais encontrados na porção molhada da praia, dado que não podem ser carregados pelo vento ou pelas marés.


No total, 603 bitucas de cigarro foram coletadas. Uma estimativa reconhecida cientificamente para medir os contaminantes que podem vazar desses itens e afetar humanos e outros seres vivos apontou categoria de “poluição severa”, a maior encontrada entre os 12 estudos já realizados que utilizaram o método em praias e áreas urbanas.


Curiosamente, outra praia com nível quase tão alto de poluição também é uma área marinha protegida, a Ilha de Saint Martin, em Bangladesh, no subcontinente indiano. Níveis comparáveis, embora menores, foram encontrados ainda na Colômbia e no Irã, além de ambientes urbanos brasileiros, nas cidades de Santos (SP) e Niterói (RJ).


“Não encontramos uma diferença significativa na quantidade de lixo entre dias da semana e fins de semana, provavelmente porque a prefeitura realiza uma limpeza com trator às sextas-feiras. No entanto, as bitucas ficam, porque passam pela malha que é arrastada pela areia e leva objetos maiores”, explica Ribeiro.


Outro índice utilizado avalia a disponibilidade de itens que podem machucar banhistas e pescadores, como cerâmica, concreto e metal, além de objetos médicos e de higiene pessoal, potencialmente infectantes. O índice de lixo antropogênico perigoso (HALI, na sigla em inglês) foi de terceiro grau, o que significa que uma “considerável quantidade de lixo perigoso é vista”.


Os níveis são parecidos com os encontrados em ambientes costeiros do Chile, da Colômbia, do Marrocos e da Nigéria, e mais altos do que na maioria dos países em que se fez essa avaliação, como Bangladesh, China, Itália e Catar, entre outros.


“Os resultados são um retrato muito claro da situação e da necessidade de uma intervenção. Ações de conscientização, instalação de ‘bituqueiras’ e lixeiras, multas e até mesmo a proibição do fumo na praia, como é feito em Barcelona, na Espanha, são algumas das opções que os legisladores e gestores têm à disposição para mitigar o problema”, conclui Castro.


O artigo Marine macrolitter and cigarette butts hazard multiple-use marine protected area and fishing community at Brazil pode ser lido AQUI.



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